Por Iago Ferraz Wild (Puck)
A simbologia do Pão e Vinho na história e espiritualidade são anteriores à Cristo e aos mistérios da Igreja. Não venho trazer essa informação pela ladainha de "acusar o Cristianismo de plágio" (como se não fosse natural todos os meios religiosos incorporarem elementos anteriores), mas para aproximar os mistérios dessa fé com as antigas fés e defender a contradição que é o proselitismo.
Muito se pode trazer sobre o tema, desde desconhecidos hábitos rurais dos antigos camponeses pagãos, até a difundida relação do vinho com Dionísio e Baco. Porém, hoje trarei Diana para mostrar uma profunda relação entre a associação vinho-Santo Sangue e pão-Santo Corpo e o olhar espiritual pré-cristão.
Diana é uma deusa relacionada com a Lua e a Floresta, embora o estudo aprofundado dessa divindade mostre-a como "Senhora de Todo o Cosmos e Natureza". Sua correspondência cósmica vem também de suas interpretações como Criadora, mas principalmente ao observar que anterior à sua assimilação lunar, a divindade fora vista como a "Senhora das Estrelas e dos Céus", além da etimologia de seu nome apontar para o dia e o Sol (um aspecto curioso e misterioso para uma Deusa que, dentro de nossa História mais conhecida, é na maioria das vezes noturna). Já a carga de "Senhora de Toda a Natureza" possui uma base científica, no sentindo de observação e sabedoria sobre o funcionamento dos ciclos da Terra: Se uma Divindade rege a Lua, necessariamente rege o Mar. E se rege o Mar, necessariamente rege toda a Vida na forma que conhecemos. Não por acaso, a "Senhora da Lua" é também a "Senhora dos Bosques".
A primeira evidência é encontrada na "Conjuração do Vinho à Diana", uma cerimônia que intenta tanto aprimorar a qualidade da bebida quanto clamar por uma boa e saudável safra de uvas quando as condições estão desfavoráveis. Abaixo, segue um fragmento da conjuração em tradução adaptada ao português:
"Bebo porém não do vinho,
Mas do Sangue de Diana,
Pois o vinho se transformou em seu sangue,
e se derramou em minhas videiras em crescimento..."
Dentro de uma lógica pagã, é óbvio associar os alimentos ao corpo e as bebidas ao sangue dos Deuses, uma vez que são produtos da Natureza e essa Natureza é literalmente parte do corpo material dos Deuses. Mas, o vinho toma uma simbologia especial por ser uma bebida que traz alegria e vigor ao consumidor, o que casa com a ideia de que todo prazer é um ato ritual à Diana.
Em relação ao pão como corpo, observem um fragmento da Conjuração do Trigo:
"Conjuro-te, ó trigo! Que és nosso corpo e sem a ti não podemos viver..."
Nesse trecho, o trigo (em alusão ao pão), é tratado não como corpo de Diana, mas como o nosso, o que sob um olhar teológico de culto à Terra, significa literalmente a mesma coisa. Mas caso isso esteja passível de interpretações diferentes, encontramos uma afirmação mais clara em uma invocação de Diana:
"Não asso o pão com o sal,
Nem cozinho o mel com o vinho,
Asso o corpo, o sangue e a alma,
A alma da (grande) Diana..."
Para além disso, vamos encontrar na literatura diversas associações da Deusa ao pão e principalmente ao vinho, mas chamo a atenção para esta última cerimônia pois ela está associada a uma ceia devotiva, portanto santa, onde os celebrantes sentam-se à mesa e celebram o corpo e sangue de Diana, num mistério semelhante à "Santa Ceia", que se difere principalmente por ser feito na escuridão sagrada da noite e com os corpos dos homens e mulheres completamente desnudos, pois além de a nudez ser sagrada à Diana, a noite evocava um espirito de liberdade e afastamento das opressões que deveria ser celebrado, sem a maldade e banalização associada à nudez de hoje em dia.
Por fim, é notável que até hoje o pão é um símbolo comum do alimento e do sustento, enquanto o vinho ainda rega os corações e os desejos de homens e mulheres, mostrando uma sacralidade que surge em tempos imemoráveis, se ressignifica no mundo cristão e perdura no imaginário, independente de credos.
Texto de Iago Ferraz Wild (Puck)- Gruta do Bardo.![Resultado de imagem para Diana stregheria](https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/4/44/Noce_di_Benevento.jpg/1200px-Noce_di_Benevento.jpg)
![](https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/3/31/Guercino-diana.jpg/800px-Guercino-diana.jpg)
"La Dianara" de Enrico Isernia e "Diana cacciatrice" de Guercino, respectivamente.
extraídos de "Aradia:
O Evangelho das Bruxas",
obra do antropólogo
Charles G. Leland.
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